A partida direta é o método mais simples e utilizado para acionar motores elétricos de indução. Apesar da sua aparente simplicidade, há diversos aspectos técnicos que precisam ser compreendidos para evitar problemas e garantir maior eficiência no uso industrial. A seguir, estão oito fatos relevantes sobre esse tipo de partida, organizados a partir de dois conteúdos complementares que exploram detalhes pouco comentados no dia a dia.
1. O formato do rotor influencia a corrente de partida
Nem todos os motores apresentam o mesmo comportamento na partida direta. A geometria do rotor pode alterar significativamente o tempo em que a corrente permanece elevada. Motores com rotores mais longos e estreitos tendem a acelerar mais rapidamente, reduzindo o tempo em que a corrente de partida se mantém alta. Isso diminui os efeitos de aquecimento e de queda de tensão, impactando diretamente a durabilidade da instalação e dos componentes elétricos.
2. Corrente elevada até 85% da velocidade síncrona
Um ponto importante é que a corrente de partida não cai logo após o motor começar a girar. Ela se mantém alta até o rotor atingir aproximadamente 85% da velocidade síncrona. Só então ocorre uma redução significativa. Isso mostra que a carga não influencia diretamente a intensidade da corrente inicial, mas sim o tempo necessário para atingir esse percentual de velocidade.
3. Partida direta também pode ser aplicada em motores grandes
Existe a ideia de que a partida direta só é possível em motores pequenos, geralmente até 15 cv. Porém, em determinadas condições, até motores de grande porte podem ser ligados diretamente, desde que a rede suporte o pico de corrente sem causar queda de tensão acima do limite de 10% estabelecido em norma. Além disso, algumas concessionárias impõem restrições específicas, o que deve ser considerado em cada caso.
4. Relação entre número de polos e corrente de partida
A quantidade de polos influencia o valor típico da corrente de partida. Motores de dois polos geralmente apresentam correntes entre 6 a 7 vezes a corrente nominal. Já motores de quatro polos apresentam valores ligeiramente menores, e motores de oito polos podem ter correntes de apenas quatro vezes a nominal. Isso ajuda a explicar por que alguns motores grandes conseguem ser ligados diretamente sem maiores impactos.
5. O tempo de aceleração afeta diretamente o aquecimento
Não é apenas o pico de corrente que causa problemas, mas o tempo em que ele permanece. Motores com cargas de alta inércia levam mais tempo para atingir a velocidade nominal, prolongando a corrente elevada e aumentando o aquecimento. Esse fenômeno pode prejudicar conexões, contatores e até o próprio motor. A analogia com um “rabo quente” ajuda a entender: mesmo com potência menor que um chuveiro, ele consegue ferver água justamente por atuar por mais tempo.
6. O torque de partida é proporcional ao quadrado da tensão
Na partida direta, como a tensão é aplicada integralmente, o torque inicial pode ser de duas a três vezes o torque nominal. Isso permite movimentar cargas de alto esforço inicial, como compressores. Entretanto, se a tensão for reduzida, como acontece em métodos estrela-triângulo, o torque cai drasticamente. Um motor que recebe 58% da tensão, por exemplo, terá apenas cerca de 33% do torque.
7. Dimensionamento correto do contator: categoria de emprego AC3
Para garantir confiabilidade, o contator usado em partida direta deve ser especificado para a categoria AC3, voltada para motores de indução. Usar contatores de outras categorias, como AC1 ou AC7A, até pode funcionar inicialmente, mas reduz drasticamente a vida útil e a resistência mecânica, levando a falhas prematuras.
8. Consequências da queda de tensão durante a partida direta
A queda de tensão excessiva pode gerar diversos problemas além do famoso “piscar das luzes”. Entre eles estão:
Repique de contatores: Quando a tensão na bobina cai demais, o contator pode desarmar e religar repetidamente. Isso causa desgaste acelerado dos contatos e pode levar ao colamento por aquecimento e arco elétrico. Imagine um motor partindo em uma fábrica e o contator “batendo” sem parar — em poucos dias, o equipamento pode falhar de forma crítica.
Danos a bancos de capacitores: Se o contator do banco se desarma e arma novamente durante a partida, os capacitores podem reconectar ainda carregados, criando um curto-circuito instantâneo. O resultado pode ser desde a queima do contator até a explosão de um capacitor, colocando em risco a segurança do ambiente.
Retroalimentação da queda de tensão: A baixa tensão causada pelo motor em partida aumenta a corrente em outros motores já em funcionamento. Isso agrava a queda de tensão inicial, criando um ciclo perigoso. Em uma planta industrial, isso pode afetar vários setores ao mesmo tempo, comprometendo a produção.
Aquecimento prolongado do motor em partida: Menos tensão significa menos torque. Isso faz com que o motor leve mais tempo para acelerar, prolongando o período de corrente elevada e elevando o risco de sobreaquecimento das bobinas.
Desligamento de outros motores por perda do selo: Em sistemas que utilizam contatores com circuito de selo, a queda de tensão pode enfraquecer a bobina a ponto de abrir o circuito, desligando outros motores sem que tenha havido um comando intencional.
Reinicialização de equipamentos eletrônicos: Computadores industriais, CLPs e até roteadores podem reiniciar em função da queda brusca de tensão. Esse efeito é especialmente crítico em linhas de produção automatizadas, onde uma simples reinicialização pode parar processos inteiros.
Atuação indesejada de proteções: Disjuntores e relés térmicos podem atuar indevidamente, interpretando os picos de corrente como falhas. Isso gera paradas inesperadas e, em alguns casos, desgaste prematuro de disjuntores devido às reenergizações constantes.
Impacto em geradores: Quando a partida direta ocorre em redes alimentadas por grupos geradores, o sistema de controle pode tentar compensar a queda de tensão elevando-a excessivamente. Ao final da partida, isso resulta em um pico de sobretensão, capaz de danificar equipamentos sensíveis.
Esses efeitos mostram que a queda de tensão na partida direta vai muito além de um simples incômodo visual nas lâmpadas. Trata-se de um problema sistêmico, que pode comprometer a confiabilidade de toda a instalação elétrica, prejudicar a vida útil dos equipamentos e até mesmo gerar riscos de segurança. Por isso, sempre que possível, recomenda-se avaliar a robustez da rede, o tipo de carga conectada e até a possibilidade de adotar métodos de partida que reduzam a corrente inicial, como soft starters ou inversores de frequência.
Embora simples, a partida direta envolve nuances que afetam tanto o desempenho do motor quanto a confiabilidade da instalação elétrica. Conhecer esses oito fatos ajuda engenheiros, técnicos e eletricistas a dimensionar melhor seus projetos e evitar problemas como aquecimento excessivo, quedas de tensão críticas e falhas em contatores. Mais do que apenas ligar um motor, trata-se de entender profundamente o impacto desse método no sistema elétrico como um todo.